CIÊNCIAS ECONÔMICAS E HISTORICIDADE: A CONTRIBUIÇÃO DE FOUCAULT À EPISTEMOLOGIA ECONÔMICA
Resumo: 1.Neste projeto, resolvi recorrer a um autor relativamente pouco citado na literatura ligada à Epistemologia Econômica e à História do Pensamento Econômico: Michel Foucault.
A partir do conceito central de episteme, conceito desenvolvido principalmente nas duas obras Les mots et les choses et L´archéologie du savoir, estudarei as principais evoluções da Ciência Econômica a partir de uma dupla perspectiva: uma abordagem arqueológica, diretamente relacionada com a exploração das condições nas quais surgiram as diferentes escolas de pensamento uma abordagem genealógica que permite explicar as dinâmicas próprias às evoluções, ou seja, ao passagem de uma episteme para outra.
Mais precisamente, a problemática geral que norteia este trabalho consiste em estudar as condições nas quais a Ciência Econômica nasceu, autonomizou-se em relação às outras ciências e às diferentes formas de poder, e evoluiu a partir da produção de diferentes paradigmas e diferentes programas de pesquisa.
Este resgate histórico se relaciona com a dimensão arqueológica da pesquisa: trata-se de reconstruir as condições sociais, políticas e históricas que tornaram possível o surgimento das diferentes escolas de pensamento, trata-se de mostrar em que medida essas escolas se relacionam com uma determinada episteme. A dimensão genealógica tem por objetivo revelar a dinâmica que explica essas evoluções.
Contrariamente à tese defendida por Popper, a evolução da Ciência não é concebida como o produto de uma dinâmica endógena, ou seja, autônoma: as evoluções não se explicam unicamente pela livre confrontação das ideias, segundo os próprios termos de Popper. A Historicidade se manifesta pelo fato das varáveis exógenas determinarem, pelo menos parcialmente, essas evoluções: essas são a combinação de determinismos que relevam da História externa e da História interna. Por esta razão, minha pesquisa se relaciona tanto com uma sociologia do conhecimento quanto com uma História das ideias e com a epistemologia. Assim, utilizarei autores como Foucault, Bourdieu e Merton; em relação ao componente epistemológico, Foucault, Heideger, Kuhn, Bachelard e Lakatos.
Esta dimensão historicista leva a questionar e a refutar o conceito de progresso da Ciência: pelo menos no longo prazo, as evoluções da Ciência não apresentam um caráter cumulativo, não se desenvolvem em uma mesma direção: ao contrário, essas evoluções são marcadas por descontinuidades e rupturas epistemológicas. Isto nos leva a modificar a perspectiva tradicional que concebe o paradigma atual como o mais elaborado, o mais completo e o mais apto para explicar a realidade estudada.
Segundo Kuhn (1991), o paradigma que não consegue resolver certas anomalias desaparece e é substituído por um outro paradigma, esse último sendo capaz de resolver essas anomalias; da mesma maneira, Foucault (1966) afirma que, em determinado período, só pode existir uma única episteme. A Economia constitui um contra exemplo, pelo fato de se caracterizar, a qualquer época, pela coexistência de vários paradigmas.
A este respeito, é preciso estabelecer um paralelo entre o conceito kuhniano de paradigma e o conceito de episteme, na definição dada por Foucault, em relação às modalidades segundo as quais a Historicidade externa é integrada na análise, à abrangência e à temporalidade própria que caracteriza esses dois conceitos.
Explicarei, na Economia, a coexistência de vários paradigmas, ou epistemes, a partir dos seguintes elementos:
(a) O caráter híbrido da episteme: de fato, mostrarei como, na Economia, uma mesma escola de pensamento, ou um mesmo autor, utiliza componentes que provém de diferentes epistemes; não existe episteme pura.
(b) Esses componentes heterogêneos permitem explicar a dinâmica das evoluções, ou seja, a passagem de uma episteme para outra.
(c) Contrariamente ao que afirma Lakatos (1970), não é possível observar a existência de um consenso, por parte da comunidade científica, no que diz respeito à escolha das hipóteses irrefutáveis que constituem o núcleo duro do programa de pesquisa científica (Merton, 1987, Bourdieu, 1984). A ausência de um consenso no seio da comunidade científica permite explicar a coexistência de vários paradigmas incompatíveis entre si.
2.3 Finalmente, a coexistência de vários paradigmas, ou várias epistemes, gerou, em todas as épocas estudadas, umas controversas não resolvidas na Ciência Econômica. É preciso analisar a natureza dessas rupturas, ou seja, determinar se elas ocorrem dentro de um mesmo sistema de pensamento (episteme ou paradigma), ou se elas constituem uma refutação do sistema atual (Herscovici, 2019).
Não pretendo realizar, neste projeto, um estudo exaustivo dessas rupturas; escolherei três controversas que me parecem serem representativas das rupturas que pontuam a História da Ciência Econômica:
- (a) A controversa de Cambridge fornece, a partir dos elementos construídos pelos neoricardianos, os componentes necessários à elaboração de uma refutação radical da Economia marginalista, nos seus fundamentos micro e macroeconômicos.
- (b) Da mesma maneira, estudarei a natureza da crítica que Hayek elabora, tanto em relação à construção neoclássica ligada ao Equilíbrio Geral, quanto à análise keynesiana. A este respeito, ressaltarei as ambiguidades da crítica de Hayek em relação à Economia Neoclássica.
- (c) Finalmente, a moeda e a finança, da maneiro como elas foram concebidas por Keynes e pela escola pós-keynesiana, permitem ressaltar as contradições e os limites explicativas da construção neoclássica.
Data de início: 01/02/2022
Prazo (meses): 24
Participantes:
Papel | Nome |
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Coordenador | ALAIN PIERRE CLAUDE HENRI HERSCOVICI |